Clemente de Alexandria - Stromata IV-V, Fuentes Patrísticas 15, - Martírio cristiano e investigación sobre Dios, edición bilingüe, introdução, tradução e notas por Marcelo Merino Rodríguez, Editorial Ciudad Nueva, Madrid, Espanha, 2003, 633 p., ISBN 84-9715-035-X
Contribuição e tradução de Antonio Carneiro das páginas 177 até 185, Capítulo XIII - 89,1-6 — 94, 1-4
89 - 1. Em verdade, também sobre estas coisas seria prolixo o discurso, que se reserva para tratar quando se apresente a ocasião. 2. Não obstante, Valentino escreve em uma homilia textualmente: “Desde o princípio [1] sois imortais, são filhos naturais da vida eterna; haveis querido compartir a morte entre vós, para aniquilá-la e consumá-la, para que a morte seja absorvida entre vós e por vós. 3. Efetivamente, quando dissolvais o mundo, mas sem que sejais vós dissolvidos, dominareis sobre a criação e sobre a destruição [2]” . 4. Com efeito, também este, como Basílides, supõe uma raça que se salva pela natureza [3]; mas que essa raça superior viria até nós aqui desde acima para destruir a morte, enquanto que a origem da morte seria obra do criador do mundo [4]. 5. Por isso (Valentino) interpreta assim aquelas palavras: “Ninguém que veja o rosto de Deus viver á” (Ex 33, 20), como se causasse a morte [5]. 6. A respeito a este Deus alude quando escreve estas expressões: “Quanto menor é a imagem do rosto vivente, tanto menor é o cosmos ao eon vivente [6]”.
90 - 1. “Qual é , pois, a causa da imagem ? É a majestade do rosto a que proporcionou o modelo ao pintor, para que seja honrado mediante o nome do modelo. Com efeito, não se encontrou de maneira autêntica uma forma, mas sim que o nome supriu o que faltou na plasmação. Desta maneira, também o invisível de Deus contribui para a fé do que foi plasmado [7]”. 2. Assim denomina ao demiurgo , chamado como Deus e Pai , imagem e profeta do Deus verdadeiro; mas chama pintor à Sabedoria , cuja plasmação é a imagem, para a glória do invisível [8]; porque o que procede de um par são plenitudes, enquanto que o que procede de um são imagens [9]. 3. Mas posto que o que aparece dele não é a alma intermediária [10], vem então o superior, o sopro do espírito superior que insufla por inteiro n’alma, na imagem do espírito; e em geral, o dito Demiurgo, feito “a imagem” [11], afirmam eles que no “Gênesis” está profetizado isso mesmo em forma de imagem sensível a respeito da formação do homem . 4. E precisamente eles se aplicam a si-mesmos a semelhança , mostrando que a comunicação do espírito superior lhes chegou sem que soubesse o Demiurgo [12].
91 - 1. Em verdade, quando formos tratar sobre a unidade de Deus, proclamada pela Lei, os profetas e o Evangelho, discutiremos também esta questão [13] (porque o logos - Logos é o primordial [14]), mas tem que ir ao encontro do que apressa . 2. Se a raça superior vem para destruir a morte, então Cristo não aboliu a morte, a não ser que se diga que também ele era consubstancial [15] à eles; por outro lado, se Ele a aboliu para que não afetasse a raça superior, não aniquilando a morte à esses, os remedadores [16] do Demiurgo, os que formam parte da alma intermediária, os que insuflam em sua própria imagem a vida que procede do alto, segundo esta doutrina herética, ainda que afirmem que isto sucede por meio da mãe [17]. 3. Mas, ainda que afirmassem que com Cristo lutam contra a morte, confessem a doutrina que permaneceu oculta, quer dizer, se atrevem a lançar invectivas contra o divino poder do Demiurgo, retificando sua criação eles, enquanto melhores que aquele, e tratando de salvar a imagem psíquica que o Demiurgo não pôde livrar da corrupção. 4. Portanto, também o Senhor seria melhor que o Deus criador. Então, o Filho nunca poderá lutar contra o Pai, porque se tratam de deuses [18].
92 - 1. Mas, que Ele é o Pai do Filho, o criador do universo , o Senhor omnipotente, deixemos para refletir sobre o que prometemos discutir frente às heresias, demonstrando que o (Pai) é o único predicado pelo (Filho). 2. Então, o Apóstolo, ao escrever sobre a paciência nas tribulações, nos diz: “Também isso vem da parte de Deus; que a vós se lhes foi outorgado por Cristo não somente crer em Ele, mas sim também padecer por Ele; sustentando o mesmo combate que haveis visto em mim e agora ouvis de mim. 3. Se tem pois, alguma consolação em Cristo, algum estímulo de amor, se existe alguma comunhão de espírito, se tem ternura e misericórdia, enchei minha usufruição, julgando o mesmo, tendo o mesmo amor, com iguais sentimentos, pensando uma só coisa” (Flp 1,28; 2, 2). 4. Se (o Apóstolo) se imola “no sacrifício e no serviço da fé” (Flp 2, 17), enquanto alegra e congratula, aos que o Logos, com o Apóstolo, aos filipenses, os chama co-partícipes da graça [19], como os denomina de idênticos sentimentos e psíquicos ? 5. De igual modo, quando escreve sobre suas relações com Timóteo, diz: “Não tenho a ninguém com os mesmos sentimentos que com sinceridade cuide do vosso. Com efeito, todos buscam seus próprios interesses, não os de Cristo Jesus” (Flp 2, 20-21).
93 - 1. Assim pois, os mencionados (hereges ), e também os frígios [20], não nos denominam psíquicos, como se fosse uma infâmia. com efeito, também esses (frígios) chamam psíquicos Àqueles que não obedecem à nova profecia ; discutiremos com eles nos (escritos) “Sobre a Profecia” [21]. 2. Então, é necessário que o (homem) perfeito pratique o amor e desde aí tenda rumo à amizade com Deus, cumprindo os mandamentos por amor. 3. O amar aos inimigos, diz (a Escritura), não é querer o mal [22], nem a impiedade, o adultério ou o roubo, mas sim (amar) ao ímpio, ao adúltero e ao ladrão, não enquanto pecam e com tais ações mancham a denominação do homem, mas sim como homens e obras de Deus. Obviamente o pecar consiste em uma ação, não em uma substância; por isso não é obra de Deus [23].
94 - 1. Os pecadores são chamados inimigos de Deus [24] pelo distanciamento que provem de seu livre arbítrio, pois são inimigos dos mandamentos, aos que não obedecem, ao igual que são amigos (de Deus) os que os obedecem e por isso são chamados familiares (de Deus) . 2. Nada é a inimizade nem o pecado sem inimigo e sem pecador. [25] O (preceito de) não desejar não revela não ter desejo algum, como se as coisas desejáveis (nos) fossem estranhas, conforme deixam deslizar os que adoutrinam que o Criador é diferente do Deus primeiro [26], quando não que a geração é abominável e má; 3. estas opiniões, pois, são ímpias, e nós chamamos estranhas às coisas do mundo, não porque sejam absurdas, nem como não pertencentes à Deus, Senhor de tudo, mas sim porque, ao não permanecermos nelas toda eternidade , são estranhas por possessão, pois são de uns e de outros sucessivamente, mas à respeito de sua unidade são próprias de cada um de nós, para quem também foram feitas; tão somente tem que aproximar-se à elas na medida do necessário. 4. Conforme, pois, ao impulso natural tem que fazer bom uso do que não está proibido, evitando toda exageração e complacência nisso.
NOTA DO TRADUTOR Para os que querem se aprofundar de forma específica neste assunto, recomenda-se a leitura do texto de Antonio Orbe , "Los hombres y el creador según una homilía de Valentín (Clem. Strom. IV, cap 13; 89,1 -91.3)", Gregorianum 55 (1974) pp. 5-48 ; 339-368.
Caso haja interesse maior pelo tema valentiniano, outros textos deste autor, descritos a seguir, poderão vir a contribuir no estudo do leitor veja também Orbe Bibliografia):
Antonio Orbe, Estudios valentinianos 5 t., Pontificia Universitatis Gregorianae (PUG), Roma, 1955-1966.
— Hacia la primera teología de la procesión del Verbo 1958, pp.(755-788). Series Estudios Valentinianos - v. 1.
— En los albores de la exegesis iohannea (Ioh. 1,3) 1955, pp.(379-387). Series Estudios Valentinianos - v. 2.
— La unción del Verbo, 1961, pp.(657-683).Series Estudios Valentinianos - v. 3.
— La teologia del Espiritu Santo. 1966, pp.(707-747).Series Estudios Valentinianos - v. 4.
— Los primeros herejes ante la persecucion. 1956. Series Estudios Valentinianos - v. 5.
Antonio Orbe, "La muerte de Jesús en la economía valentiniana", Gregorianum 40 (1959) pp. 467-499; pp. 636-670
Antonio Orbe, "La encarnación entre los valentinianos", Gregorianum 53 (1972) pp. 201-235.
Antonio Orbe, "Los valentinianos y el matrimonio espiritual. Hacia los orígenes de la mística nupcial", Gregorianum 58 (1977) pp. 5-53.
Antonio Orbe, "Trayectoria del Pneuma en la Economía valentiniana de la salud", Compostellanum 33 (1988) pp. 7-52.
Antonio Orbe, Biblia y teologiá entre los valentinianos: ejemplos de interferencia entre exegesis y teologia (1996) - In: Augustinianum 36 (1996) pp. 5-12